Hoje, o melhor dia da minha vida

O Diário de Um Adicto

22 de dezembro de 2021
atualizada em 23 de dezembro de 2021
"Hoje, o melhor dia da minha vida." Uma nova maneira de viver um dia de cada vez". Não perca o mais novo capítulo de O Diário de Um Adicto
"Hoje, o melhor dia da minha vida." Uma nova maneira de viver um dia de cada vez". Não perca o mais novo capítulo de O Diário de Um Adicto

Naqueles dias, naquelas ruas........

Eu não conseguia distinguir a fantasia da realidade. Vivia movido por comportamento impulsivo e incontrolável. Não sentia culpa, aos meus olhos, eu era sempre inocente. Estava preso a um padrão improdutivo, usando as mesmas substâncias, nos mesmos lugares, com as mesmas pessoas, mas querendo um resultado diferente. E nada que trouxesse o tal resultado diferente acontecia.

Como já disse em outros artigos "sou um adicto" e devo admitir ser impotente perante a minha Adicção e que minha vida, em determinado momento, tinha se tornado incontrolável.

Aceitei mudar atitudes e comportamentos e isso não se dá de um dia para o outro. É uma mudança lenta e gradual, porém precisa ser honesta.

Não estou reduzido, nem eu e nem ninguém, a um estado de desespero absoluto. Estou trabalhando e vigiando meus passos. Aprendi a viver um dia de cada vez. Viver uma nova vida 24 horas por dia com um único objetivo: encontrar a Paz começando em mim.

Não é uma decisão meramente simples e sem consequências deixar hábitos, lugares, pessoas e principalmente sentimentos para trás. É doloroso. Foi uma decisão que precisou ser tomada de forma racional com muita fé, que necessitou ter a rendição como um ato libertador.

Acredito que exista uma força universal a qual eu chamo de Deus. Venho aprendendo, com o auxílio de um programa espiritual, como devo me prontificar para que defeitos de caráter sejam removidos do meu ser. Para tanto é necessário estudar e buscar o autoconhecimento.

Na ala de psiquiatria do HPM, éramos chamados para nos reunirmos e praticarmos alguns exercícios desse programa. Essa era a metodologia do trabalho com os internos: os 12 Passos. Foi quando meu despertar espiritual começou.

Sempre sentávamos em círculo e era sugerido que cada um se apresentasse e falasse um pouco de si da maneira que estivesse podendo e querendo. Era estudado um passo de cada vez. Um psicólogo e um membro de uma entidade dirigiam nossa reunião.

Por meio das falas dos companheiros foi possível perceber a doença como fonte de grande sofrimento e como é difícil conviver com ela. Os relatos demonstravam bem isto: a angústia, o vazio, o sufoco e o desespero ocasionados pela doença, que, aos poucos, pude perceber que cada um tinha a sua. E que a do outro fazia parte da minha também. A mesma origem, o mesmo sentimento, as mesmas reações, o mesmo fim. Essa união nos levava a um encontro com o silêncio que respeitava nossas dores. Sem aflição, conseguíamos conviver em paz aquele momento não tão fácil. Nós nos aceitávamos mutuamente, mesmo com todos os nossos erros.

Ali, a força do amor agia para que nenhum de nós, nem mesmo aquele que precisava passar alguns dias amarrado em uma cama, se sentisse desamparado ou sozinho como uma ovelha sem pastor.

Talvez, eu ainda não conseguisse, naquela condição em que me encontrava, amar o outro como a mim mesmo. Eu estava ali por conta de uma doença que me levou a sarjeta por não conseguir amar nem a mim. Precisava aprender a me amar primeiro. Precisava aprender a ficar limpo, precisava conhecer minhas feridas. Precisava, também, conhecer minhas forças.

Agora, que o sentimento de compaixão e empatia em relação à tristeza alheia, convivendo dia após dia dividindo o mesmo espaço e partilhando as mesmas dores, me tocou, eu posso afirmar que: hoje, já consigo olhar para o outro e desejar para ele, o que desejo para mim.

Antes, a doença me fornecia informações distorcidas sobre o que acontecia em minha vida. A Adicção me dizia para não olhar para mim mesmo, porque o que veria seria muito assustador.

Eu agradeço muito por Jesus ter formado os seus discípulos e antes de ser crucificado lhes deixado esta ordem: “vá e curai os enfermos, limpai os leprosos, ressuscitai os mortos, expulsai os demônios e levai a minha palavra; de graça recebestes, de graça deveis dar”.

De certa maneira, sinto que essa ordem chegou até a mim através de sua palavra de sua compaixão e de sua misericórdia. E só foi possível por meio de minha fé.

Hoje, estou estudando a primeira Bem-aventurança do valioso 'Sermão da Montanha', que está à disposição de todos nas escrituras sagradas, nos livros de Mateus e Lucas; "Bem-aventurado os humildes de espírito porque deles é o reino dos céus...”.

Preciso entender o que é a “humildade” e como a sua presença se revela em minha vida.

Uma coisa eu já sei: se realmente acredito que um poder superior pode devolver a minha sanidade, não vou ficar inquieto pelo dia de amanhã, porque o dia de amanhã cuidará de si mesmo. Viverei para sempre só por hoje!

Feliz Natal!

imagem de
Natalino Molaes
Escritor, publicitário, redator, roteirista de comerciais e concept para planejamento publicitário
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