Esgoto faz espelho d’água da Jacuném sumir e vai matando uma das maiores lagoas do ES
Uma das formadoras do rio que cai na praia de Jacaraípe está agonizando com poluição que gera crescimento excessivo de plantas sobre a água
A poluição por esgoto está matando a lagoa Jacuném, a 2ª maior lagoa da Serra e uma das maiores do Espírito Santo. A prova está na imagem capturada na última quarta-feira (06) no trecho próximo a um condomínio fechado na altura de Feu Rosa: não se vê mais o espelho d’água da lagoa, apenas o que parece ser um imenso gramado.
Trata-se do crescimento excessivo de vegetação aquática, que ocorre por conta do grande volume de matéria orgânica proveniente do esgoto, tratado ou não, lançado na lagoa. Para o secretário de Meio Ambiente da Serra, Cláudio Denícoli, o problema está se agravando por conta da precariedade do tratamento de esgoto conduzido pela Parceria Público Privada (PPP) Cesan/Ambiental Serra, alvo de questionamentos da Comissão Especial de Inquérito da Câmara de Vereadores e de auditoria do Tribunal de Contas do Estado.
Segundo Cláudio, cerca de 5 ETEs (Estação de Tratamento de Esgoto) lançam efluentes em córregos que formam a Jacuném, que é uma Área de Proteção Ambiental (APA) municipal e faz parte da bacia do rio Jacaraípe. Em outras palavras, a água poluída da Jacuném cai na praia de Jacaraípe na altura da Praça Encontro das Águas.
Quadro só se agrava
Do Instituto Brasileiro de Fauna e Flora (Ibraff), Claudiney Rocha, diz que a situação da lagoa piorou nos últimos anos com o crescimento urbano e aumento da população nas regiões dos CIVITs I e II (Centro Industrial de Vitória). Para ele, as deficiências no sistema de tratamento de esgoto doméstico apontadas pelo secretário, pela Comissão Especial de Inquérito (CEI) da Câmara de Vereadores e por auditoria do Tribunal de Contas do Estado (TCES), acelera o crescimento da vegetação sobre o espelho d’água.
“O esgoto aumenta a presença de nutrientes na água, o que estimula a proliferação descontrolada da vegetação sobre a água. E isso também acaba piorando o assoreamento da lagoa", enumera Claudiney, que mora na região de Jacaraípe e atua há anos na defesa do meio ambiente da bacia das lagoas Juara e Jacuném.
Esgoto Industrial
Um dos bairros no entorno da Jacuném é Barcelona, no CIVIT I. Ainda está na memória dos moradores mais antigos do bairro, surgido no início da década de 1980, os banhos e pescarias na Jacuném, além das piqueniques às margens. Hoje nem dá para chegar mais perto da lagoa, que inclusive teve o acesso fechado para implantação do Batalhão da Polícia Militar Ambiental onde é a sede da APA, que deveria estar aberta ao público.
Morador do bairro há décadas, o professor e ativista político Renato Ribeiro diz que a poluição é muito grande.
“Fizeram sistema de tratamento de esgoto nos anos 1980 e não atualizaram. O que mais vejo no entorno da área verde é vazamento de esgoto da rede da Ambiental Serra, com a sujeira caindo direto nas nascentes da lagoa. E o pior é que não foi modernizada a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) de Barcelona, que está recebendo esgoto de novos loteamentos e condomínios na região. Não dá conta”, avalia.
Mas além do esgoto doméstico, Renato lembra que a Jacuném também é alvo de despejo de esgoto industrial.
“No entorno da lagoa há diversas indústrias dos Civit’s I e II. E várias vezes autoridades ambiental flagraram despejo indevido de rejeitos de indústrias na lagoa".
Em 2005, por ocasião da instalação do condomínio Boulevard Lagoa na região de Feu Rosa, a imobiliária Cristal teve de fazer um estudo sobre a qualidade da água da Jacuném. Esse estudo apontava, já naquela época, presença de fenóis em quantidade superior a 100 vezes o limite máximo estavebecido por lei.
Fenóis são substâncias tóxicas provenientes principalmente da indústria de plásticos, corantes, tintas, drogas (medicamentos), antioxidantes, polímeros sintéticos e resinas, dentre outros. E também está presente no esgoto doméstico.
Cesan e Ambiental Serra multadas
Na última semana de março a PPP foi multada pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semma) em R$ 4,8 milhões. O motivo foi o mal funcionamento de 12 ETEs, cujos efluentes estavam sendo lançados no meio ambiente com sujeira acima do permitido por lei. A multa da Cesan foi de R$ 2,4 milhões. Mesmo valor aplicado na Ambiental Serra.
Desde janeiro de 2015 a gestão do esgoto da cidade é feito pela PPP.
O outro lado
A reportagem procurou a Ambiental Serra. A assessoria de imprensa da empresa disse que quem responderia os questionamentos a respeito da situação do lançamento de efluentes de ETEs na lagoa Jacuném seria a Cesan. Então os questioamentos foram enviadas à Companhia, que até o momento desta publicação ainda não havia retornado.
No entanto, no último dia 31 de março, o gerente da Cesan para a PPP, Douglas Couzi, divulgou nota rebatendo as acusações de que as ETEs em operação na Serra não estariam funcionando adequadamente.
No documento, a empresa diz que as Estações operam dentro dos padrões de eficiência estabelecidos por lei, embora admita que nem sempre o efluente jogado no ambiente após o tratamento permanece neste padrão legal.
Disse ainda que “eventuais não conformidades são e serão sempre tratadas conforme previsões contratuais”.
E mais: Falou ainda que “para se obter resultado fidedigno à peformance de eficiência das ETEs é necessário realizar amostragens frequentes. Análises isoladas, sem referenciais comparativos, podem não refletir a realidade do desempenho dos equipamentos”.
Por fim, a Cesan diz que atendeu todas as solicitações de documentos e esclarecimentos pedidas pelo TCES e pela Comissão de Investigação da Câmara de Vereadores.