Desmatamento da Mata Atlântica ainda é muito preocupante, afirma diretor de Instituto Nacional

Presidente do Insitituto Nacional da Mata Atlântica, o ecólogo Sérgio Lucena, foi escolhido esta semana para mais quatro anos de mandato. Confira entrevista concedida ao Convergente

14 de abril de 2022
atualizada em 14 de abril de 2022
Sérgio Lucena comanda o INMA deste sua efetivação em novembro de 2017. Nesta entrevista ele faz um balanço e revela planos para os próximos passos da Institução. Foto: Divulgação/INMA
Sérgio Lucena comanda o INMA deste sua efetivação em novembro de 2017. Nesta entrevista ele faz um balanço e revela planos para os próximos passos da Institução. Foto: Divulgação/INMA

Na segunda-feira (11) o ecólogo Sérgio Lucena teve o nome confirmado pelo Governo Federal para um mandato de mais quatro anos no comando do Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA), cujas instalações administrativas ficam no Museu Melo Leitão, em Santa Teresa. No último dia 07, Lucena recebeu o Convergente, quando fez um balanço dos quatro primeiros anos do INMA, revelou os planos para o futuro da Instituição, demonstrou preocupação com a destruição da Mata Atlântica na região serrana resultante da especulação imobiliária em torno de sítios e chácaras. Falou também da importância de Augusto Ruschi para a cidade e para a ciência mundial, além de declarar apoio à devolução da área que o estado doou ao Sesc para a construção do Parque Temático Augusto Ruschi em Santa Teresa.

Quando foi cirado o INMA?

O Insituto foi criado em 2014 por lei, mas demorou para que o Governo Federal baixasse um decreto regulamentando a lei. O museu Melo Leitão passou por um período de transição meio complicado, inclusive ele nem era mais do Ministério da Cultura e nem estava formalmente ligado ao Minstério da Ciência e Tecnologia (MCTI). Foi um período de estresse, foi mantido o diretor que já vinha do Ibram (Instituto Brasileiro de Museus), que era o Hélio Fernandes. Teve uma época que faltou orçamento e o museu chegou a fechar as portas. Somente em 2016 a lei foi regulamentada e em 2017 foi aprovado o regimento do INMA. E aí no 2º semestre daquele ano foi criado o Comitê de Busca para escolher o diretor, foi quando me inscrevi e entrei. Então, assumi em novembro 2017, data em que efetivamente o Instituto passa a funcionar.

O que faz o Instituto Nacional da Mata Atlântica?

É um órgão público federal cuja missão é contribuir com conhecimento científico e divulgação científica para as políticas públicas relacionadas à conservação da Mata Atlântica e desenvolvimento sustentável no âmbito deste bioma. É nosso papel difundir esse conhecimento para os mais diversos setores.

Ano passado fizemos nosso planejamento estratégico 2021 – 2030, em que mostra esse perfil do INMA como uma instituição que, além de produzir conhecimento científico através de nossos zoólogos, ecólogos, botânicos, etc, trabalha em rede para produzir sínteses sobre o conhecimento científico da Mata Atlântica. E tornar esse conhecimento acessível para um público não acadêmico.

A gente tem uma missão de Estado: dar base científica para o Estado brasileiro gerir esse bioma tão importante, a Mata Atlântica, cuja conservação está prevista na Constituição Brasileira e posteriormente foi confirmada em lei específica (Lei da Mata Atlântica, 2006).

Qual é o orçamento do INMA e quantos pesquisadores estão vinculados à insituição?

Para 2022 o orçamento é de R$ 3,29 milhões. Um de nossos gargalos é o número baixíssimo de pesquisadores efetivos. Os cargos comissionados que foram previsto para estruturar a gestão do Instituto, em sua maioria, não foram liberados pelo Governo. E não foi aberto concurso para composição de equipe. Recebemos apenas alguns pesquisadores e funcionários de outros institutos. Estamos suprindo esta falta através de nosso programa de capacitação institucional, que é um programa do MCTI que oferece bolsas para atrair pesquisadores para instituição. Se pegarmos a equipe própria e somarmos com os bolsistas, hoje, dá na faixa de 50 pessoas trabalhando com ciência no INMA.

Quais as pesquisas desenvolvidas pelo INMA nesses pouco mais de quatro anos de existência?

Nosso programa abrange um leque de pesquisas estratégicas que envolvem desde pesquisas locais até temas nacionais. Por exemplo, no Programa de Capacitação Institucional do INMA tem seis projetos. O primeiro é ecologia e conservação da Mata Atlântica na região central serrana do Espírito Santo. É desenvolvido sobretudo na Reserva Biológica Augusto Ruschi, na Estação Biológica de Santa Lúcia e entorno. O que a gente espera, olhando lá pra frente? Transformar Santa Teresa, e região, num polo internacional de pesquisa da Mata Atlântica. Monitorar a longo prazo fauna, flora e clima. 

E os demais estudos?

O projeto dois é em parceria com pesquisadora do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, cujo tema é a restauração da bacia hidrográfica do rio Doce. É, sobretudo, um projeto de base de dados de flora, de modelagem de aptidão de diferentes espécies para a recuperação de áreas degradadas. Modelagem de solo e de clima.

Nosso projeto três busca lacunas de conservação nas unidades de conservação de fauna e flora ameaçadas de extinção na Mata Atlântica. Nós temos uma equipe cruzando os dados das espécies ameaçadas de extinção que ocorrem na mata Atlântica com a distribuição das área protegidas para ver se existem lacunas. 

Nosso outro projeto foca nos escossistemas rupículas ou rupestres, esses afloramentos rochosos em que você tem um ecossistema muito típico. Tem no ES, em MG e aonde estamos trabalhando na Serra do Padre Ângelo em Conselheiro Pena. Além de terem muitas novidades científicas, esses ecossistemas tem sistemas adaptativos muito peculiares e são laboratórios evolutivos. Têm clima muito inóspito, vento, frio, seca, sol... É outro enfoque.

O quinto projeto é a história da conservação da Mata Atlântica brasileira. Esse projeto começou com a produção sobre Augusto Ruschi, já produzimos três livros sobre Augusto Ruschi desde que entrei aqui no final de 2017. Ainda nesta frente, estamos organizando, com o pessoal da ciência da informação, sobre a produção científica relacionada à mata Atlântica no Brasil: quais são as lacunas de conhecimento, quais são os atores, as redes de relação. Isso é muito importante para a gente entender a ciência da Mata Atlântica.

O sexto projeto é sobre ciência cidadã. Tem gente que trabalha com fauna, anfíbios, répteis, aves, etc, que procuram envolver a comunidade científica, principalmente Santa Teresa, num processo de produção científica. Simplificando, é ter o cidadão não especialista participando da produção da informação científica. Então, você tem vários níveis de ciência cidadã. O mais aprofundado é aquele que o cidadão ajuda a coletar os dados, ajuda a analisar e particpa da publicação depois.

São leigos que registram plantas, animais e outras situações de interesse para as pesquisas do INMA?

Extamente. Por exemplo, nós temos um projeto no entorno da reserva Augusto Ruschi que monitora anfíbios e bromélias. Então, tem uma rede de moradores locais que registra quando fotografa um anfíbiozinho, uma bromélia... Eu acredito muito na ciência cidadã porque ela ajuda na pesquisa científica e produz informação. E tem a função educativa, mostra a importância da ciência, como se faz ciência e acaba cativando algumas pessoas para a carreira científica.

Além desses seis projetos que o senhor citou, há outros trabalhos?

Nós temos um outro projeto de iniciativa do MCTI que é o Regenera Brasil. É focado em estudar a regeneração de ecossistemas no Brasil e está começando agora. Nós cuidamos do módulo Mata Atlântica. É recurso do próprio Minstério. No nosso caso é comparar diferentes modelos de restauração da floresta e mostrar quais estão sendo mais efetivos.

O INMA cuida de outros espaços físicos, além da área do Museu de Biologia Melo Leitão no centro de Santa Teresa?

Sim, outras duas áreas. Uma fica na Estação Biológica de Santa Lúcia, cuja gestão compartilhamos com a UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Museu Nacional e Sociedade de Amigos do Museu Nacional. Esse foi o arranjo que Ruschi (Augusto) fez na época para proteger essa área. Fazemos uma gestão compartilhada da Estação Biológica Santa Lúcia com as outras instituições. Lá tem alojamento para pesquisador e laboratório de campo. Agora, pavimentamos os acessos às casas. É uma Estação voltada para pesquisa e educação. A outra área é uma gleba da Estação Biológica de São Lourenço, contígua a àrea pertencente à Prefeitura. Lá ainda não temos a infraestrutura para pesquisa.

O senhor falou que há dificuldade em ter pesquisadores efetivos e o INMA também tem um orçamento limitado. Além desses, quais são os outros gargalos?

Como Instituto Nacional, é óbvio que nós precisamos crescer, nos estruturar. Agora, com a demanda dessa turma toda coletando, fazendo trabalho de pesquisa aqui, precisamos de laboratórios, precisamos de maior espaço para coleções de zoologia e botânica. Aqui dentro (do Museu Melo Leitão) não dá. Não posso sair cortando árvore para construir prédios. A idéia é que o Museu siga sendo a área para atividades educativas, receber visitantes, fazer exposições, ou seja, a interação com a comunidade. Nós precisamos de um campus novo para expandir o INMA. Eu estou pedindo ajuda à Prefeitura de Santa Teresa e ao governo do Estado para isso.

No início da década de 2010, a Prefeitura chegou a oferecer uma área na cabeceira do córrego São Pedro, próximo à Aparecidinha, para servir ao futuro Instituto que na épóca estava embrionário. Por que não fluiu?

Por sinal, é uma área muito bacana com 120 hectares. Mas não aconteceu essa transferência. Ficou meio de boca, alguns vereadores disseram que não era bem assim, que aquilo foi adquirido pelo município para outra finalidade. Não rolou, porém é uma possibilidade que não descarto.

Mas o ideal seria mais próximo da cidade. Cado o governo, ou Prefeitura, tenha uma área que esteja subutilizada, porque o que acontece é que está muito difícil o Governo Federal dar dinheiro para comprar propriedade. Porque ele vai falar para ir ao SPU (Secretaria de Patrimônio da União) que tem um monte de imóvel que o Governo não sabe o que fazer com eles. Então não vai comprar novas coisas. Mas esses imóveis estão na Grande Vitória, em geral. Até poderia, mas não é o que a gente quer. A história está aqui, a Mata Atlântica está aqui.

O museu Melo Leitão é um patrimônio do ES. Capixabas de diferentes gerações cresceram vindo aqui. Com o recuo da pandemia, como está a visitação?

O público está vindo. No domingo já chega a 1,5 mil visitantes. Nos períodos mais intensos da pandemia, quando podíamos abrir, a média mensal já chegava a 6 mil pessoas. De fevereiro pra cá, com a reabertura dos agendamentos das escolas, a expectativa é que o número de visitantes cresça e se aproxime dos 92 mil que tivemos ao longo de 2019, último ano antes da pandemia. Como a população do centro de Santa Teresa gira em torno de 10, 12 mil, então é muita gente que vista nossa área. O que movimenta a economia da cidade. Por isso, que a gente acha que precisa estreitar a parceria com a cidade, com a Prefeitura, para resolver esse desafio nosso que é o de espaço para expansão. É mais fácil eu conseguir alguns milhões com a FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos do MCTI) para construir um prédio administrativo do que para comprar um terreno.

Caso o INMA consiga essa nova área e estrutura, o que acontecerá com o Museu Melo Leitão?

Continuaria como sempre foi, local de visitação e aproximação com a comunidade. Por exemplo, nesta casa (residência de Augusto Ruschi, local onde a entrevista foi concedida) queremos implantar o Museu Augusto Ruschi, dentro do conceito de casa-museu, com exposição permamente da memória da vida e obra do cientista. Estamos trabalhando esse projeto junto com o pessoal do Rio de Jeneiro, do Museu de Astronomia e Ciência Afins.

As coleções de zoologia e botânioca também estão em espaços improvisados. Então precisamos resolver isso nos próximos anos.

Quais são os dias, horários e contatos para os interessados em visitar o Instituto e o Museu Melo Leitão, inclusive grupos de estudantes?

As visitações acontecem de terça à domingo, das 8h às 17h. Grupos precisam de agendamento, o telefone é 27 3259-2100. E é preciso enviar e-mail para o endereço agendamento@inma.gov.br.

Como você avalia a importância de Augusto Ruschi, não só para Santa Teresa e ES, mas para o Brasil e a ciência mundial?

Apesar do Ruschi ter morrido em 1986, não havia nenhum trabalho científico embasado em documentos sobre a história dele. Agora, temos três desenvolvidos no INMA. E eles mostram a relevância de Ruschi na história mundial. Ele tinha uma rede de colaboração, de intercâmbio internacional muito sólida que vinha aqui fotografar beija-flor. Gente como Crowford Greenwalt, presidente da DuPont na época, uma das maiores empresas do mundo. Foi ele quem mandou construir a casa de hóspedes do Museu.

Veio também o Victor Hasselblage, da máquina fotográfica Hasselblage, tão famosa. Vinha aqui testar a câmara dele com os beijas –flores. Ruschi também tinha uma conexão política muito boa, inclusive com o próprio presidente Juscelino Kubischeck. Ruschi foi um excelente difusor da ciência, que usou como argumento para defender a natureza. Lidava muito bem com a mídia. O maior magnata da imprensa brasileira da época, Assis Chatobriant, vinha aqui de helicóptero. Era amigo do Ruschi, que também frequentava a casa do Assis no Rio.

Ruschi também foi pioneiro nas grandes questões mundiais. Escreveu um livro chamado Agroecologia, sendo um dos primeiros a publicar esse nome no Brasil. Era um cara de vanguarda. E isso é fantástico, pois se trata de um cidadão nascido numa cidadezinha do interior do ES. Em 1949, quando foi fundado o Museu, para ir de Santa Teresa a Vitória devia gastar o dia inteiro viajando. Ruschi colocou Santa Teresa no mapa do mundo. O beija-flor se tornou símbolo não só de Santa Teresa, mas do Espírito Santo.

E teve uma sacação muito importante, já idoso, que foi transferir o Museu para o poder público federal. Era um homem de visão, pois existem vários casos de pessoas notórias que deixam patrimônio para a família e por questões de inventário, herança, se esfacela. E aí perde-se a história. Ruschi tinha a preocupação de dar continuidade ao que ele começou.

Ruschi não era bobo. Ele teve oportunidade de transferir ao governo do estado, até de incorporar à Ufes. Mas ele não quis. Ele só sossegou quando conseguiu entrar com o Museu no Governo Federal. Na minha interpretação, toda essa obra se tornar o Instituto Nacional da Mata Atlântica deveria ser o sonho de Ruschi. Hoje, o INMA está no 1º escalão do Ministério da Ciência e Tecnologia.

Dá para falar que a inteligência sobre a gestão da Mata Atlântica, hoje, passa por Santa Teresa?

Isso está no nosso planejamento estratégico. Trabalho científico de qualidade da Mata Atlântica brasileira tem muitos espalhados por diferentes instituições, universidades, jardins botânicos e revistas internacionais.

Então, nosso planejamento estratégico mostra a necessidade de trabalhar em rede, ou seja, conectar esse conhecimento que está espalhado pelo Brasil, na área de Mata Atlântica, e torná-lo acessível a gestores tomadores de decisão. É um desafio grande que não é da noite para o dia que vai se conseguir.

Como o senhor vê a situação da Mata Atlântica no Brasil?

Desde a Constituição de 1988 a mata Atlântica vem passando por processo de reversão do desmatamento para a regeneração, principalmente regeneração natural. Agora, tem um programa que envolve várias instituições, que é o MAPBiomas, que monitora desde a década de 1990. Então, há indícios da recuperação, através da regeneração natural, em vários estados brasileiros. Em parte pela legislação, primeiro pela pela Constituição que declarou a mata Atlântica como patrimônio nacional, até que a Lei da Mata Atlântica fosse aprovada em 2006. Esta proibiu o corte raso, você não pode chegar e desmatar uma área em estágio médio avançado de regeneração para plantar mais alguma coisa.

E outra coisa, se deve ao avanço tecnológico. A agricultura passa por uma tendência de tecnificação e redução da demanda de espaço, o que libera áreas para regeneração. Então, esse é o lado positivo. Mas a floresta que cresce não é mais aquela com a mesma diversidade e riqueza da fauna e flora que tinha antes. Então você tem um processo de regeneração que precisa ser melhorado. Por exemplo, através da regeneração natural assistida, controlando ervas daninhas, plantas invasoras, cercando para o gado não pisotear.

Mas, nos últimos anos, Santa Teresa e outras cidades da região serrana do ES têm registrado muito desmatamento. No litoral também. E noutros estados onde há o bioma, idem…

Sim. Há um processo de desmatamento presente por motivações às vezes muito pontuais, mas altamente procupantes. Eu cito o exemplo da região serrana do Espírito Santo com a demanda por chácaras, sítios, etc, que é um processo relativamente novo. O pessoal da Grande Vitória quer ter uma casa de campo, um sítio perto da natureza, e tem uma rede de especuladores entrando em áreas que são de Mata Atlântica e estão fazendo loteamentos irregulares, ocupações desordenadas. Às vezes você vê liberações, que vc não entende como pode ter sido emitido para aquele tipo de empreendimento. Aí o cara mete a máquina, aterra beirada de rio e esse barro vai para dentro dos rios, assoreando os cursos d’água.

Há suspensões frequentes no abastecimento de água da Grande Vitória por conta do excesso de barro na água dos rios em que a Cesan capta…

Exatamente. Para você ver que não é uma coisa localizada. O que se faz aqui nas montanhas reflete lá embaixo. O que se faz nas nascentes dos córregos São Pedro e São Lourenço (rio Reis Magos) tem consequências para a comunidade da Grande Vitória. Esse problema (de especulação imobiliária) também afeta trechos de Mata Atlântica e ecossistemas associados no litoral, de alta demanda imobiliária, muita especulação, aonde está se entrando, desmatando, ocupando de forma irregular.

Em algumas regiões a taxa de desmatamento anual ainda é alta. Os dados da SOS Mata Atlântica com o INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) têm demonstrado que em alguns estados, como Bahia e Minas Gerais em 2020, o desmatamento ainda é grande. No Espírito Santo foi relativamente pequeno no período.

Então o senhor considera a situação menos dramática no ES?

Eu reumiria: A situação da Mata Atlântica ainda é muito preocupante. Até porque ao longo do século XX o desmatamento foi avassalador, não parou, embora tenha reduzido. O problema maior é que grande parte desse desmatamento ocorre em Área de Preservação Permanente (APP). Principalmente margens de córregos, rios e brejos, onde, ou se faz lagoa artificial ou se drena para colocar o gado. Esse tipo de ação continua e o impacto nas APPs é muito grande. Nós temos um défcit, calculado pela Fundação Brasileira de Desenvolvimento Sustentável, de 7 milhões de hectares na mata Atlântica em todo o país para atender o Código Florestal. É muita terra. Pode ter certeza de que não é plantado árvores que vamos conseguir isso, será preciso usar a regeneração natural.

Para uma pessoa que mora na cidade e que tem pouco ou nehnum contato com florestas: Como o senhor explicaria a importância da Mata Atlântica?

As matas oferecem serviços ambientais para as pessoas. Água de qualidade e constante depende da floresta. Em locais desmatados a enxurrada leva terra para o rio e tem que suspender o abastecimento. E depois que a enxurrada passou, seca rapidamente as nascentes, porque não teve floresta para reter água no solo. Outra coisa é a polinização que os insetos da mata fazem em lavouras próximas, inclusive dos cafezais. Há estudos que comprovam que cafezais próximo às matas são mais produtivos.

Tem ainda a estabilidade microclimática, o que deixa o ambiente mais fresco e agradável. E proteção do solo. Se a enxurrada leva embora o solo, daqui a pouco você estará com terras abandonadas, como você vê no noroeste do Espírito Santo. O bem estar, até espiritual, de você ter a floresta, ter os pássaros, ver essa mata florindo em volta da gente, é uma coisa que faz bem.

Gostaria que o senhor fizesse um balanço de gestão à frente do INMA. (Quando a entrevista foi feita o nome de Lucena ainda não havia sido anunciados pelo MCTI para mais um ciclo à frente do Instituto).

A minha grande preocupação foi compor equipe. Não adianta você ter mil ideias na cabeça se você não tiver pessoas para tocar as coisas. Foi um trabalho difícil, porque não foi autorizado consurso nesse período e tentei trazer pessoas de outras instituições. A conta gotas, consegui alguns profissionais. Então montei um núcleo de gestão que, embora pequeno, são de profissionais muito qualificados. Mas a demanda é muito grande para o tamanho da equipe.

E para pesquisa a gente conseguiu um programa de capacitação institucional razoável – o PCI - que permitiu a gente começar produzir conhecimento científico. Nos últimos meses temos conseguido divulgar na imprensa produtos da nossa ciência.

Também montamos outros programas, articulados entre si, para o futuro do Instituto. Por exemplo, o projeto de criar a casa-museu Augusto Ruschi, a estruturação da Estação Biológica de Santa Lúcia, que estamos investindo nela e melhorando os acessos. Também, estamos fazendo projeto para refeitórios.

Estamos estabelecendo uma rede de colaboração. Criamos o Conselho Técnico Científico, ou seja, estruturamos o Instituto minimamente para que ele possa cumprir a sua missão. Ano passado concluímos o planejamento estratégico. E agora tem uma série de demandas, nós fomos muito prejudicados por dois anos de pandemia.

Se abriu uma linha de pesquisa de história da ciência e isso é uma coisa nova para a gente aqui.

Um grupo de moradores e frequentadores da cidade está realizando o movimento Salve o Parque, que pede a devolução da área de 100 m2, onde seria implantado o Parque Temático Augusto Ruschi, que o SESC ganhou do estado em 2010 para construir um hotel e até hoje não fez. O que o senhor acha dessa reivindicação?

Eu acho excelente. Desde que tenha uma parte para a gente expandir o INMA lá. Acho que é possível conciliar o Parque para a cidade e as instalações do Instituto. É uma área estratégica, nobre, na entrada da cidade.

 

imagem de
Bruno Lyra
Jornalista especializado em coberturas ambientais e professor de geografia
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