Destruição de matas e nascentes em Alto Santo Antônio ameaça rio do Vale do Canaã
Implantação desordenada de loteamentos, chacreamentos e condomínios na zona rural segue deixando rastro de impactos no meio ambiente de Santa Teresa
Cenário de devastação. É o que se vê em Alto Santo Antônio, um dos lugares até então mais preservados da Mata Atântica em Santa Teresa. O motivo é a expansão imobiliária desordenada de sítios, chácaras, loteamentos e condomínios em terrenos rurais. Situação que coloca em risco um dos mais importantes rios de Santa Teresa, no Espírito Santo: o Cinco de Novembro, provedor da cada vez mais escassa água das comunidades do Vale do Canaã.
A degradação é escancarada e pode ser vista às margens da estrada que liga o Centro de Santa Teresa à Alto Santo Antônio. Numa delas há obras para a implantação de um condomínio, onde houve escavação de nascentes, derrubada de Mata Atlântica e implantação de lagos artificiais sem qualquer proteção nas margens. O solo está totalmente exposto após passarem trator nas encostas, deixando a terra sujeita à erosão e cursos d’água vulneráveis ao assoreamento.
Noutro ponto, já mais próximo do campo da comunidade de Alto Santo Antônio, aterros avançam na várzea e já se aproximam das duas margens do rio Cinco de Novembro, não respeitando a distância mínima da Área de Preservação Permanente (APP).
Há, também, platôs sendo abertos no meio da mata e muito perto do rio. E o exemplo de um condomínio, já consolidado e repleto de casas, num local onde as imagens de 2009 do Google Earth mostram que no local havia mata Atlântica. Um dos sitiantes desse condomíno, inclusive, fez um lago artificial e passou a criar peixes na nascente que abastece a antiga comunidade de Alto Santo Antônio, gerando reclamações de poluição da água por parte dos moradores.
Reserva Biológica Augusto Ruschi na mira
Próximo à região da degradação fica a Reserva Biológica Augusto Ruschi, que com seus 3,5 mil hactares é a maior área pública de mata Atlântica preservada na região centro serrana do ES. A Reserva é adminstrada pela União e leva o nome do cientista e ambientalista teresense Augusto Ruschi (1915 – 1986), considerado o patrono nacional da ecologia, cuja luta pela preservação da natureza é reconhecida mundialmente.
A pressão imobiliária em Alto Santo Antônio é, ao lado da caça ilegal e das queimadas, mais uma ameaça para a Reserva.
Patrimônio, Barracão e São Roque
Depois de percorrer as montanhas de Alto Santo Antônio, as águas do rio Cinco de Novembro tombam a serra rumo ao Vale do Canaã, sendo essenciais para irrigação, pecuária e abastecimento da comunidade de Patrimônio (Santo Antônio do Canaã). Pouco abaixo, chegam ao rio Santa Maria do Rio Doce. Este percorre e abastece São João de Petrópolis (Barracão) e o Centro do município de São Roque do Canaã, indo cair no rio Doce em Colatina.
O Cinco de Novembro é o principal afluente do Santa Maria do Doce. E esta é uma bacia hidrográfica em terras que estão em processo de desertificação em decorrência do intenso desmatamento ocorrido ao longo do século XX.
O morador de Patrimônio e ativista comunitário José Roberto Netto, o Bebeto, lembra que há três anos o Cinco de Novembro secou completamente durante a estiagem e por pouco não paralisou completamente a fábrica de laticínios Fiore, principal empregadora da comunidade. Segundo ele, Patrimônio tem hoje cerca de 3, 5 mil moradores que dependem do rio.
Na superseca de 2016 as comunidades de Patrimônio, Barracão e São Roque chegaram a depender de carro pipa porque o rio secou.
Deputado aciona a Polícia Ambiental
A destruição ambiental em Alto Santo Antônio provocada pela expansão imobiliária desordenada é alvo do deputado estadual Sérgio Majeski (PSDB), que acionou a Polícia Ambiental para verificar a situação a pedido da ONG Juntos SOS ES Ambiental, dirigida pelo Engenheiro Químico e ambientalista Eraylton Moreschi.
Prefeitura diz que fiscaliza e embarga atividades ilegais
Em nota, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente diz que trabalha para reprimir irregularidades embargando atividades em desacordo com a legislação ambiental e remetendo ao Ministério Público. Mas não falou das situações específicas flagradas em Alto Santo Antônio. Leia a íntegra da nota.
A Secretaria Municipal de Meio Ambiente realiza de forma habitual fiscalização no município. Todas as áreas em que é verificado em vistoria a movimentação de solo em desacordo com a legislação em vigência, o proprietário é notificado quanto a paralisação e embargo da atividade e todo procedimento é encaminhado ao Ministério Público, a fim de que se tome as medidas judiciais cabíveis. - Nota da Prefeitura
A reportagem também acionou o Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do ES (IDAF) e Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (IEMA), mas até o momento desta publicação, não havia recebido retorno.
E como são diversos os pontos de degradação retratados neste reportagem, não foi possível identificar todos os responsáveis. Por isto, optou-se em não divulgar nomes de pessoas físicas e jurídicas ligados aos projetos imobiliários degradadores.
Município e vizinhos das montanhas vivem sequência de crimes ambientais ligados ao mercado imobiliário
Nos últimos anos intensificou-se a busca por terrenos rurais para implantação de sítios, chácaras, loteamentos e condomínios nas montanhas. O problema é que alguns agentes desse mercado acabam adentrando áreas de florestas, nascentes e parcelando o solo rural além do que a legislação permite, gerando impactos negativos.
Tanto, que em maio, o governo do estado deflagrou a Operação Curupira para tentar coibir essas práticas. E há duas semanas, em ação conjunta com município, Ministério Público e IBAMA, flagrou crimes ambientais em sequência no circuito do Caravaggio.
Outras regiões de Santa Teresa, também, têm efrentando problemas semelhantes: Penha, Valsugana Velha, Santa Lúcia, Alto São Lourenço, por exemplo.