Doação de área do povo ao Sesc segue na Justiça e movimento luta pela devolução de parque público

Advogada da Ação Popular aponta que processo deverá ir à 2ª instância. Enquanto isso movimento trabalha para que o Parque Augusto Ruschi volte para a população teresense.

18 de julho de 2022
atualizada em 18 de julho de 2022
Trecho do rio Timbuí na área do Parque Augusto Ruschi, hoje em poder do Sesc para a construção de hotel. Foto: Bruno Lyra 07/04/22
Trecho do rio Timbuí na área do Parque Augusto Ruschi, hoje em poder do Sesc para a construção de hotel. Foto: Bruno Lyra 07/04/22

Segue em andamento e prestes a entrar em 2ª instância a Ação Popular movida por moradores e ativistas de Santa Teresa que pede anulação da doação do terreno do Parque Temático Augusto Ruschi ao Sesc para a construção de um hotel. Assim como também está em andamento o ‘Movimento Salve o Parque’, criado para fortalecer a luta pela devolução do imóvel de 100 mil m2 à população.

Em declaração dada ao Convergente nesta segunda-feira (18), a advogada da Ação Popular, Giovana Fidalgo, explica que fará um recurso de apelação no processo. O que deve levá-lo à 2ª instância, no Tribunal de Justiça do ES. Por equanto o processo ainda segue na Vara Única da Comarca de Santa Teresa e já trouxe vitória parcial às partes autoras que ingressaram com a Ação Popular.

“Conseguimos vitória com a sentença (do juiz Alcemir dos Santos Pimentel) proferida em 2017 que determinou a manutenção do parque público aberto à população e a casa do governador, mesmo que também tenha permitido à doação ao Sesc e o direito ao mesmo de construir o hotel. Mas fiz um recurso chamado embargo de declaração. Este recurso foi negado, porém ainda não fui intimada sobre a decisão. Quando isso acontecer ingressarei com recurso de apelação, que jogará o processo à 2ª instância” - Giovana Fidalgo, advogada da Ação Popular. 

“Houve desvio de finalidade de ato administrativo”

A advogada acrescenta que os autores da Ação Popular seguem lutando para “provar que houve desvio de finalidade de ato administrativo” por parte do Estado na doação do terreno ao Sesc, ocorrida em dezembro de 2010. Giovana lembra que o terreno havia sido doado nos anos 1960 pela família Gramlich à Prefeitura e esta, repassado a área ao governo estadual, que construiu no imóvel a casa de campo do governador.

Como o imóvel passou a ser cada vez menos usado, o Estado resolveu repassá-lo em comodato para a Prefeitura novamente na década de 2000. Esta, com recursos próprios e do Ministério do Turismo, investiu mais de R$ 1 milhão para a implantação de um parque público, cuja alcunha homenageia o cientista de renome mundial e ambientalista teresense Augusto Ruschi (1915 – 1986).

Mas a população sequer usou o espaço. Logo após a construção do Parque Temático houve a doação ao Sesc. Este colocou um caseiro para morar na residência do Governador e impedir que a comunidade acesse o espaço. O Sesc até hoje não fez obras no local. As estufas de plantas construídas pela Prefeitura não existem mais. O pórtico e a guarita da entrada estão deterioradas.

A Ação Popular que pede a anulação da doação foi movida em 2013 por um grupo de moradores e ativistas liderados pelo filho e herdeiro intelectual de Augusto, André Ruschi (1955 – 2016).

‘Movimento Salve o Parque’

No final de 2021 foi criado o Movimento Salve o Parque para a apoiar a Ação Popular em curso no judiciário. Coordenado pela ativista Carmem Barcellos, o Movimento já realizou duas audiências públicas sobre o assunto, a última delas no dia 30 de junho em Santa Teresa. As audiências foram realizadas em parceria com o deputado estadual Fabrício Gandini (Cidadania), que é membro da Frente Parlamentar da Conservação da Biodiversidade Capixaba.

O movimento também realiza petição pública on line que pede a anulação da doação ao Sesc e a implantação do parque. Até a tarde desta segunda-feira já havia coletado 1.508 assinaturas.

Também nesta segunda –feira, a coordenadora Carmem Barcellos que o movimento segue trabalhando pela reversão da doação “a despeito da omissão de boa parte das nossas autoridades sobre o tema”.

Hotel em local com Mata Atlântica, rio e nascente

O terreno de 100 mil m2 fica ao lado da escola Ethevaldo Damazio, na entrada da cidade. Nele, além do casarão que foi residência do governador, há pomar, gramado, remanescentes de Mata Atlântica, represa, nascente, córrego e um trecho do rio Timbuí. Um avaliador imobiliário de Santa Teresa ouvido em maio por Convergente calcula em cerca de R$ 50 milhões o valor do imóvel.

O projeto divulgado pelo Sesc para o local é o da instalação de complexo turístico de grande porte, sendo três prédios com hotel contendo 280 quartos, centro de convenções para 1,5 mil pessoas, estacionamento para 2 mil carros e parque aquático.

Porém, no final de Junho, a instituição que comanda o Sesc, a Fecomércio, modou de direção. Em declaração ao jornalista Abdo Filho de A Gazeta, o novo presidente da Fecomércio, Idalberto Moro, admitiu a possibilidade de implantar um projeto de menor porte em Santa Teresa.

Convergente entrou em contato com o Sesc para saber como seria essa mudança no projeto. Mas, no dia 04 de julho, a assessoria de imprensa da entidade emitiu nota dizendo que não poderia dar mais informações em razão da judicialização do caso. Veja a íntegra:

Atualmente, há um processo judicial em que se discute a legalidade da doação feita pelo Estado do Espírito Santo. O SESC só poderá decidir sobre manutenção do projeto aprovado, ou alteração do mesmo, quando do término da demanda judicial. O SESC/AR-ES é uma instituição séria e que atua em conformidade com a legislação vigente, inclusive respeitando as determinações judiciais que forem proferidas sobre o caso - Sesc, via assessoria de imprensa

Falta licença ambiental e averbação da casa do governador

Passados quase 12 anos da doação, o Sesc ainda não tem a licença ambiental para construir o hotel e os demais equipamentos anunciados. Este processo de licenciamento transcorre na Prefeitura de Santa Teresa. E um dos motivos alegados pelo próprio Sesc pela dificuldade no licenciamento é o fato do governo do ES ainda não ter averbado o casarão que era a residência do governador. Ou seja, ainda faltam documentos relativos à doação.

Em entrevista ao Convergente no dia 03 de junho, o governador Renato Casagrande (PSB) disse que o Estado ouvirá a comunidade de Santa Teresa sobre a doação. Já na 1ª audiência pública promovida pelo Movimento Salve o Parque e o deputado Gandini em 12 de maio na Assembleia Legislativa, o representante do Governo do ES negou que houvesse irregularidade na doação.

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Bruno Lyra
Jornalista especializado em coberturas ambientais e professor de geografia
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