A importância da desjudicialização para a resolução de conflitos
O tempo médio da ação de conhecimento é de 5 anos e 2 meses
Com a formatação do poder judicial as pessoas passaram a ficar mais confortáveis, uma vez que uma terceira pessoa é quem decide seus conflitos, caso algo não dê certo, não se sentem culpadas pelo erro.
Ter o poder judicial decidindo por nós, nos tornou mais indolentes quanto à responsabilidade na solução do conflito em que estamos inseridos. Tendemos a não prever determinado resultado, senão aqueles massificados do senso comum, tornando o conflito algo muito ruim e ficando um sentimento de culpa.
Se você não conseguir aceitar como “normal” o conflito, seja de qual índole for, o conflito sempre será enxergado como algo negativo, carregado do sentimento de culpa. Culpa, porque não foi melhor, culpa porque não foi perfeito, ou porque não recebeu os elogios que esperava e, principalmente, por ter suas expectativas frustradas.
A culpa paralisa e a pessoa não consegue se sentir confiante. Temos como característica do sentimento de culpa a dificuldade de aceitar os resultados negativos de uma decisão, ou de uma atitude. O culpado fica estagnado no erro, remoendo-o, martirizando-se sem conseguir sair dali, gerando o sentimento de não merecimento.
Devemos mudar o paradigma e desenvolver o sentimento de responsabilidade. Com este sentimento, as pessoas sentem o poder de decidir sobre determinada situação. O responsável olha para o erro, tenta compreendê-lo e percebe que se foi responsável por ele, se contribuiu para tal, então é, igualmente, responsável pelo reparo ou mudança. Cria-se uma Inteligência emocional e autoconhecimento gerando consciência e clareza sobre o problema.
A Constituição das Nações Unidas, para a educação, ciência e cultura, afirma que:
[...] Posto que as guerras nascem na mente dos homens é na mente dos homens onde devem erigir-se os baluartes da paz.
Então, se está em cada indivíduo os baluartes da paz, existe para tanto um ponto de partida?
Sabemos que o tom de voz e a maneira como falamos é capaz de começar uma guerra ou gerar empatia e amor. É verdade que muitas pessoas encontram dificuldades em se comunicar. E por quê? Como podemos falar de forma contundente e fazer a diferença em um diálogo?
Segundo Julian Treasure, existem quatro comportamentos e condutas que facilitam uma conversa tornando-a amistosa. A primeira delas é a Honestidade - seja verdadeiro naquilo que você diz, sendo direto e claro. Segundo, Autenticidade - seja você mesmo, verdadeiramente, e estar sobre suas próprias verdades. Integridade - você agir conforme a sua palavra, na verdade fazer o que você diz, é ser alguém que as pessoas podem confiar. Amor - não quer dizer o amor romântico, o que se sente no início de um relacionamento, mas aquele que deve sentir a qualquer próximo, desejar o bem.
Nenhuma dessas quatro condutas deve ser absoluta. Elas só funcionarão se as quatro estiverem juntas até um certo ponto. Por exemplo: dizer que uma pessoa está feia (honestidade absoluta) não gera empatia, mas sim ser honesto com amor. Juntas, essas funcionam.
Conclui-se que não é somente o que se diz, mas a maneira como se fala é muito importante para resolução de um conflito através do diálogo. E mais, a forma como você impacta o outro, o jeito como você se posiciona, como se comunica, é muito mais importante do que a ferramenta utilizada.
YUNG nos ensina que devemos conhecer todas as técnicas, todas as ferramentas e as teorias. Mas ao nos depararmos com um ser humano, devemos ser somente o ser humano com estado de presença, com conexão e empatia. Precisamos recuperar nossa humanidade!
Estudos em Harvard concluíram que o mais importante de todas as técnicas é a conexão, o Rapport. Porque, se você conseguir se conectar com outro, você consegue realmente alcançar os reais interesses dessa pessoa.
Mas o que é Rapport? Rapport é uma palavra de origem francesa que significa estabelecer uma relação de proximidade com o outro e se conectar. Essa técnica é muito utilizada para sessões de terapia, onde o terapeuta busca de maneira rápida e eficaz estabelecer uma intimidade, proximidade com seu paciente e assim conseguir chegar a raiz do problema. Numa análise mais subjetiva, o Rapport é empatia, é entender a necessidade do outro e agir da melhor forma possível.
Passo então a explanar algumas técnicas do Rapport para facilitar a conexão:
EYEBROW FLASH - é um comportamento muito observado nos primatas, e também nos humanos, que consiste no rápido levantar de sobrancelhas quando encontramos com alguém conhecido. Esse sinal faz com que as pessoas vejam em nós como uma pessoa amigável, que faz parte do mesmo grupo.
MOSTRAR A PALMA DA MÃO - expor a palma das mãos concomitantemente a fala pode demonstrar que não se está ameaçando. Isso faz com que as nossas ideias sejam mais aceitas.
ESPELHAMENTO - consiste em imitar a respiração de uma pessoa e aos poucos, automaticamente, falará no mesmo tom de voz do outro. Imitar algumas expressões corporais também é interessante. Contudo, deve-se tomar cuidado para não parecer forçado, e com isso, passar a imagem de falsidade.
EMPATIA E ACOLHIMENTO - o acolhimento é quando você aceita a pessoa da forma que ela é, e a compreende verdadeiramente, mesmo com todos os defeitos, todas suas singularidades. Com esse acolhimento, gera empatia do próximo. A empatia consiste em se colocar no lugar do outro. Quando se acolhe alguém se compreende melhor como aquela pessoa percebe a realidade.
Essas técnicas fazem toda a diferença quando nos deparamos com o eminente conflito. Contudo, uma vez surgido o conflito que não conseguimos evitar, a justiça é o melhor caminho? Atualmente existe uma afluência para a desjudicialização de lides. Mas qual a relevância da desjudicialização no Brasil?
Existem mais de 100 milhões de processos judiciais para, aproximadamente, apenas 17 mil juízes julgarem. No Brasil são mais de 60 milhões de processos pendentes para um total de 12.472 magistrados. Esses dados são apenas da justiça estadual no âmbito Nacional, não englobando para tanto a justiça do trabalho, justiça militar, etc.
A taxa de congestionamento no tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo está atualmente em 66%. Essa taxa mede o percentual dos novos processos que ficam pendentes de solução final (cumprimento de sentença) em relação ao ano que foi ajuizada a ação, ou seja, quando se protocola uma ação, em 66% dos casos, a solução final NÃO se dará no mesmo ano.
O tempo médio da ação de conhecimento é de 5 anos e 2 meses, e se houver recurso soma-se o tempo médio de mais 06 meses. Insta destacar que após o processo de conhecimento, inicia em muitos casos a fase de execução - quanto da sentença surgir um título exequível, e aqui no estado do Espírito Snato leva em média 5 anos e 2 meses.
Fica claro que em alguns casos a justiça ainda será o melhor caminho e por vezes único, como por exemplo quando se tratar de interesses de incapazes (menores de 18 anos, etc), onde, obrigatoriamente deverá existir a oitiva do Ministério Público.
Contudo, mesmo nesses casos, pensar colaborativamente sempre trará resultados positivos, porque os ganhos são mútuos, os relacionamentos perduram e as questões irão ser resolvidas de forma positiva.
Leia mais no Justiça Em Números 2020.
Marjorie Seidel é advogada Colaborativa, Membro do Comissão Estadual de Práticas Colaborativas da OAB-ES; especialização pela Universidade ESSEC Business School em “Negociação, Mediação e Resolução de conflitos”; e, curso “Transformação do Conflito” pela EMORY UNIVERSITY. Cursos “Habilidades de Resolução de Conflitos”; “Tipos de Conflitos”; e, “Comunicação Intercultural e Resolução de Conflitos”. Estes últimos pela Universidade da Califórnia. Para saber mais acesse o site: www.seideladvocacia.com.br
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